Estudo pode melhorar eficácia de tratamento de câncer de cérebro e de pele

18 de dezembro de 2017
O tratamento quimioterápico de pacientes com glioma – o tipo mais comum de câncer de cérebro – e melanoma – o mais agressivo dos tumores de pele – tem sucesso limitado devido, principalmente, à resistência das células tumorais aos medicamentos disponíveis hoje para tratá-los.


Embora essa resistência seja geralmente associada aos mecanismos de reparo dessas células dos danos ao seu DNA causados pelos quimioterápicos, há muitos outros fatores moleculares envolvidos, afirmam especialistas da área.


Um grupo de pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, em colaboração com colegas do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), identificou durante um estudo realizado com apoio da Fapesp que um desses fatores é o estresse oxidativo – o acúmulo de formas reativas do oxigênio nas células tumorais, como as de glioma e de melanoma.


Os pesquisadores também demonstraram que a combinação de duas drogas pode ampliar a eficácia do tratamento para combater esses dois tipos de câncer. O trabalho foi publicado na revista Oncotarget e venceu o oitavo Prêmio Octavio Frias de Oliveira, entregue no início de agosto, na categoria Pesquisa em Oncologia.


“O objetivo do estudo foi entender por que algumas células tumorais são mais resistentes ao tratamento quimioterápico e outras não”, disse Clarissa Ribeiro Reily Rocha, pós-doutoranda no ICB  com bolsa da Fapesp e principal autora do estudo, juntamente com o professor do ICB Carlos Frederico Martins Menck.


A fim de tentar encontrar essa resposta, os pesquisadores analisaram quatro linhagens diferentes de células de glioma sensíveis e resistentes à temozolomida (TMZ) – quimioterápico que é a principal opção de fármaco disponível hoje para o tratamento de glioma, também usado para combater melanoma ao induzir danos no DNA e aumentar os níveis de estresse oxidativo das células tumorais.


Os resultados das análises indicaram que as células mais resistentes ao fármaco apresentavam maiores níveis de glutationa – um peptídeo que desempenha um papel crítico na manutenção do equilíbrio celular ao eliminar radicais livres e que confere proteção às células ao eliminar suas toxinas.


“O problema, contudo, é que a glutationa também pode se ligar a drogas que agridem as células tumorais para inibir sua ação e expulsá-las”, explicou Rocha.


Ao avaliar o que contribui para que as células mais resistentes ao TMZ apresentem níveis mais elevados de glutationa, os pesquisadores observaram que elas também tinham maior expressão do gene NRF-2 (sigla de nuclear fator erythroid 2-related fator 2), que desempenha um papel crucial na resposta das células contra agentes oxidativos.

Outras constatações foram que a TMZ induz a expressão do NRF-2 nas células de glioma e que, por sua vez, esse gene estimula a produção de glutationa como uma forma de proteger as células tumorais contra o ataque do fármaco.


“Observamos que o NRF-2 desempenha um papel crucial na resistência ao TMZ por meio da síntese e utilização da glutationa”, afirmou Rocha.


Com base nessa constatação, eles realizaram experimentos in vitro – com células de glioma resistentes a TMZ – e in vivo – com células tumorais injetadas em camundongos – em que silenciaram os genes NRF-2 para verificar se isso diminuía a resistência das células ao fármaco.


As análises dos dois experimentos apontaram que o silenciamento do NRF-2 potencializou a indução da morte das células tumorais resistentes ao TMZ.


“A ideia, agora, é verificar se o NRF-2 poderia ser um marcador molecular para indicar se tumores de pacientes que têm maior expressão do gene têm também maiores chances de serem resistentes ao tratamento quimioterápico e se esse gene poderia modular o reparo a danos no DNA das células tumorais provocados por essas drogas”, explicou Rocha, que realizou um estágio de pesquisa no Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, com bolsa da Fapesp, com o intuito de responder a essa pergunta.


Droga experimental


Os pesquisadores também realizaram um experimento em que trataram linhagens celulares de glioma e melanoma com TMZ em combinação com um inibidor de síntese da glutationa, a butationa sulfoximina (BSO).


As análises indicaram que a combinação das duas drogas potencializou substancialmente a morte celular de células resistentes a TMZ.


“Vimos que a combinação das duas drogas tem efeito sinérgico, ou seja, potencializa o efeito que esses fármacos teriam separadamente”, afirmou Rocha.


Para investigar se o efeito sinérgico de TMZ combinado com BSO também ocorre in vivo, eles inocularam as duas drogas tanto isoladamente, como juntas em diferentes grupos de camundongos com glioma e melanoma.


Nove dias após a inoculação eles observaram que o grupo de animais tratado só com BSO apresentou um aumento 70 vezes maior no tamanho do tumor em comparação com seu volume inicial.


Já no grupo de animais tratado só com TMZ houve um aumento aproximado de 40 vezes no volume tumoral, e o grupo submetido ao tratamento com a combinação das duas drogas registrou uma redução da progressão tumoral aproximadamente 10 vezes maior durante o período de tratamento.


“Estamos propondo o uso da BSO combinado com TMZ para melhorar a eficácia do tratamento quimioterápico de glioma e melanoma”, disse Rocha.


A BSO está em fase de teste clínico em combinação com outros quimioterápicos para o tratamento de outros tipos de câncer.


O fármaco já foi aprovado na fase 2 de testes clínicos, que tem o objetivo de obter mais dados de segurança e começar a avaliar a eficácia de um novo medicamento ou procedimento, contou a pesquisadora.


“Nossa ideia é realizar testes clínicos com TMZ combinados com moduladores de glutationa, que não apenas a BSO. O que importa é conseguirmos modular a glutationa”, afirmou Rocha.


O artigo NRF2 and glutathione are key resistance mediators to temozolomide in glioma and melanoma cells  pode ser lido na revista Oncotarget.

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