Chefe da emergência do Hospital Federal de Bonsucesso é exonerado após denunciar falta de médicos

21 de junho de 2017

Após denunciar seus superiores ao Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj) por crimes contra a vida, Julio Noronha foi exonerado, nesta quarta-feira, do cargo de chefe da divisão de emergência do Hospital Federal de Bonsucesso. Também nesta quarta-feira, os colegas de trabalho liberaram uma carta em apoio ao médico. O Ministério da Saúde ainda não esclareceu os motivos da exoneração.


— A minha demissão sumária pelo próprio ministro da Saúde é uma demonstração de fraqueza do ministério. A estratégia é clara: corta a cabeça de quem reclama, assustando os demais — declarou Noronha.


Em documento entregue ao Cremerj, Noronha responsabilizou a diretora-geral da unidade, Lucia Bensiman da Silva, e o diretor do Departamento de Gestão Hospitalar do Ministério da Saúde no Rio, Marcus Vinícius Fernandes Dias, pela falta de médicos em quantidade suficiente para garantir atendimento aos 60 pacientes internados na emergência.


Depois da denuncia, a diretora do hospital determinou a reorganização da escala de plantão. Agora, segundo a unidade, cada dia tem pelo menos quatro médicos. O Departamento de Gestão Hospitalar do Ministério da Saúde informou que solicitou a exibição da escala dos 94 médicos lotados na emergência e afirmou que o hospital dispõe de 892 médicos.


— Oitocentos e noventa e dois médicos é uma deslavada mentira. Ou o ministro da Saúde está mentindo ou está mal assessorado. Essa informação é errada — afirma Noronha.


Ele declara que, durante uma reunião com a direção, foi verificado que são 26 clínicos na emergência, e que cerca de 60% dos atendimentos são clínicos. Segundo Noronha, tirando os profissionais que estão de férias e licença, restam 22.


Não é a primeira vez que o médico é exonerado por fazer denúncias. Em 2012, foi exonerado do mesmo cargo após denunciar ao longo de todo o ano de 2011 a falta de infraestrutura do hospital.


— Eu passei por isso durante a vida inteira, nunca me submeti ao que eu achava que não era certo. Não estou me vangloriando, mas acho que a gente tem que ter paz de espírito para viver bem — declara. — Meu sentimento é de dever cumprido.


Em apoio ao colega, os médicos do hospital liberaram uma carta aberta à população do Rio de Janeiro que segue o padrão das afirmações de Noronha. “Quando uma denúncia que reflete apenas a realidade é feita, o médico é demitido. Pedimos ajuda, na verdade socorro. Por favor”, diz um trecho da carta. Por receio, nenhum médico assinou com seu nome próprio o documento.
 

CARTA ABERTA À POPULAÇÃO DO RIO DE JANEIRO


Informo que o médico Dr. Júlio Noronha, Diretor da Divisão de Emergência do Hospital Federal de Bonsucesso foi exonerado do cargo ontem após ter feito uma denuncia e apresentar dados que comprovam a falta de RH (médicos, enfermeiros e outros) no setor de Emergência além de ter responsabilizado a atual Direção da Instituição pela não renovação de inúmeros contratos de médicos temporários (cerca de 55% de todo o Hospital é constituído de profissionais com contrato temporário com a União) que tiveram recentemente seu fim, em 40 dias 20 médicos tiveram o contrato extinto mesmo com intenção de permanecer na unidade de Emergência.


Estando agora a Emergência do HFB com déficit de médicos, contribui para o cenário atual de completa falta de condições de trabalho, que se soma à falta de materiais básicos, medicamentos, antibióticos, higiene e macas por exemplo.


O ministério da saúde responde com números fictícios e diz que existe médico suficiente, mas a realidade não se esconde e a população está vendo todos os dias na emergência do hospital federal de Bonsucesso. Sobram pacientes pelas cadeiras e macas pelos corredores e faltam médicos para prestar assistência adequada correndo riscos reais e morrendo diariamente na emergência do HFB.


Os médicos que por uma questão de ética denunciam, são punidos. É inadmissível que um agente público ao cumprir o seu papel de expor a irregularidade no serviço público seja punido com o afastamento de suas funções de coordenar do setor como se o problema fosse ele. No mesmo dia que o coordenador da emergência efetuou a denuncia pelos meios de comunicação de massas foi solicitada sua exoneração pela Diretora-Geral Lúcia Bensiman e publicado as pressas em diário oficial.


Informo ainda, que para se manter no cargo, a Direção não gera notícias negativas na mídia colocando panos quentes nos problemas cotidianos. A Dra. Lucia Bensiman, tenta impor aos médicos que ainda resistem trabalhando nessas condições a fazer rodizio em 4 dias da semana pela completa e total falta de clínicos no setor, fato esse que logo mais irá se estender para Cirurgiões, Pediatras e Ortopedistas.


O CREMERJ já abriu Sindicância para investigar e esclarecer esse problema conforme notícia de hoje. Essa Direção esta ávida somente pelo poder, sem se importar com a vida dos pacientes que estão sem visita médica diária e sem o mínimo de suporte para doenças mais graves, lembrando que os pacientes acompanhados neste Hospital por natureza são portadores de doenças crônicas com grandes chances de complicação e de difícil manejo clínico. Não nos recusamos a atender a população, pelo contrário.


É unânime entre os profissionais que além de sobrecarregados fisicamente e mentalmente, as condições de trabalho, já penosas há muito tempo, chegaram a um ponto crítico e insustentável.Quando uma denuncia que reflete apenas a realidade é feita, o Médico é demitido.Pedimos ajuda, na verdade socorro. Por Favor.


ASS: MÉDICOS DO HOSPITAL FEDERAL DE BONSUCESSO. (21/06/2017)

Fonte: 
Jornal Extra

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